terça-feira, 28 de janeiro de 2025

A Ampliação da pista do Aeroporto de Londrina é ‘excesso de zelo’?

Foto: Douglas Kuspiosz - Folha de Londrina / Reprodução


 O QUE FOI DITO?

    Durante a entrega oficial das obras de ampliação e readequação da pista, pátio e terminal do aeroporto de Londrina, evento que ocorreu em 22 de janeiro de 2025, nas imediações do aeroporto Governador José Richa (Londrina). O excelentíssimo governando do estado do Paraná, Senhor Carlos Roberto Massa Junior, conhecido pela alcunha de Ratinho Júnior, disse em relação a ampliação da pista, que é desejada pelo munícipio e munícipes de Londrina, que “não há necessidade” ampliar em mais 450 metros” e que a pista de Londrina “é do tamanho da de Congonhas.

    Além da fala acima, registada e publicadas pelo jornalista Douglas Kuspiosz, reportagem local, da Folha de Londrina, Ratinho Junior ainda disse que “Isso é um excesso de zelo, nem a própria ANAC exige isso. Mas é claro que o aeroporto tem a necessidade de estar reinvestindo, pensando no futuro. Mas hoje não tem essa necessidade [de ampliação]. Hoje, com esse porte, está no tamanho ou até maior que 90% dos aeroportos do Brasil, do interior”, afirmou.

    O governador não possui formação técnica em aviação, o que pode ter influenciado sua opinião sobre a necessidade de ampliar a pista ou, sequer, sua assessoria poderia ter aconselhado melhores palavras que soam quase que “estapafúrdias” para os ouvidos de engenheiros, especialistas e técnicos em aviação comprometidos com a doutrina de Segurança Operacional.


FOTO: Aeroclube de Brasília, Diego Pablo Alves Rodrigues.


DOUTRINA DE SEGURANÇA DE VOO

    Somos doutrinados desde os primeiros estudos sobre a aviação, sobre teoria de voo, sobre infraestrutura básica e primordialmente que não existe “excesso de zelo” na aviação, ainda mais no tocante “segurança de voo”.

    Londrina, hoje, possui uma pista de pousos e decolagens com um dimensionamento físico de dois mil e cem metros de comprimento por quarenta e cinco metros de largura (2.100 x 45). Entretanto, nós temos limitações físicas (obstáculos) próximos as cabeceiras dessa pista o que limitam seu espaço físico disponível para pouso. 

    A cabeceira 13, que está localizada no sentido oeste para leste (centro para limoeiro) possui grandes obstáculos para as aeronaves, e não são somente torres e antenas de radiotelevisão, são prédios altos da região central e centro-sul, margeando o famoso bairro Fazenda Gleba Palhano, esses obstáculos são responsáveis por um recuo de cabeceira (atualmente) de 190 metros, fazendo com que a pista disponível para pouso das aeronaves seja de 1.910 metros. Já a cabeceira 31, no sentido leste para oeste (limoeiro para centro) não possui grandes obstáculos e pode usufruir significativamente do espaço físico disponível, ou seja, os 2.100 metros de pista para que a aeronave possa utilizar seus dispositivos de frenagem e efetuar um pouso seguro.

    Para decolagem a limitação física basicamente se inverte e para as aeronaves que decolam da cabeceira 31 elas possuem 1.910 metros para utilizar toda a pavimentação e alçar voo, mantendo um gradiente de subida mínimo para que não a exponha a perigos com os obstáculos anteriormente citados no centro e centro-sul da cidade, as edificações da cidade.

    Na aviação, há um consenso de que a segurança é fundamental. Uma máxima popular, embora tenha caráter machista na leitura atual, resume essa ideia: 'Três coisas que nunca são demais: pista, mulher e combustível na aviação. Em hipótese alguma, na aviação internacional, tanto para a Federal Aviation Administration (FAA), a brasileira Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), a EASA (European Union Aviation Safety Agency), algum especialista/técnico em regulação de aviação civil vai dizer que um maior comprimento de pista é ‘excesso de zelo’.

FOTO: Arte de João Vicente Machado Sobrinho - Site próprio.


EXCESSO DE ZELO

    Não existe ‘excesso de zelo’ na aviação, uma pista maior pode salvar vidas, pode economizar para uma companhia aérea que não irá necessitar usar potência máxima em seus motores para conseguir decolar uma aeronave completamente carregada, em condições atmosféricas desfavoráveis e em dias quentes, quando o ar estará com pressão baixa, cheio de umidade e a temperatura fica acima dos 30ºC. Se o Excelentíssimo Governador, tivesse o conhecimento de Performance de Aeronaves e Motores, talvez sua fala teria sido outra. Pista maior significa segurança, economia e estabilidade. Não somente na decolagem, mas no pouso uma pista mais longa altera as configurações de frenagem das aeronaves, utilizando menos energia para que as dezenas de toneladas possam converter cinética em calor e assim desacelerar, ou seja, quanto menor a pista, mais energia é convertida e mais material de freio é consumido, elevando os custos para as companhias aéreas que pesam na fórmula entre manter ou criar novos voos de/para Londrina.

    Para evitarmos de trazer aqui gráficos de performance, tanto de motores, quanto de aeronaves de médio porte, para as aeronaves como o Airbus A320 CEO e Boeing 737-800 NG, em um carregamento máximo, a depender da temperatura e pressão do ar, os 1.910 metros limitados na 31 e 2.100 metros na cabeceira 13 já ficam em uma margem estreita para o carregamento da aeronave com carga paga (passageiros e carga despachada). Assim como é no aeroporto de Congonhas, onde além das condições meteorológicas, São Paulo também está em uma altitude média de 760 metros, contra 585 metros de Londrina, ou seja, lá o ar ainda é mais rarefeito e prejudica diretamente a performance das aeronaves. Congonhas opera somente as tradicionais aeronaves Airbus família A320 (A319/A320 CEO/NEO), Boeing 737 (-700/-800) e Embraer E-Jets (E1/E2), além do ATR 72 que é uma aeronave extremamente versátil em comprimentos e pavimentos de pistas.

FOTO: Montagem Google - Reprodução.


COMPARAÇÃO DE COMPRIMENTO DE PISTA

    Para finalizar esse texto, vamos comparar o tamanho da pista de Londrina com o tamanho da pista dos aeroportos na região, relembrando que atualmente a pista 13/31 possui 2.100 metros de comprimento por 45 de largura.

  • Aeroporto Internacional  de Foz do Iguaçu – Foz do Iguaçu/PR (510,7 km de Londrina)
    Pista 15/33 – 2.102 m x 45 m.
  • Aeroporto Dário Guarita – Araçatuba/SP (310 km)
    Pista 05/23 – 2.120 m x 35 m
  • Aeroporto Moussa Nakhl Tobias – Bauru-Arealva/SP (306,5 km)
    Pista 17/35 – 2.010 m x 45 m
  • Aeroporto Regional de Presidente Prudente – Pres. Prudente/SP (164,5 km)
    Pista 12/30 – 2.100 m x 35 m
  • Aeroporto Silvio Name Junior – Maringá/PR (112 km)
    Pista 10/28 – 2.380 m x 45 m
  • Aeroporto Internacional de Campo Grande – Campo Grande/MS (618 km)
    Pista 06/24 – 2.600 m x 45 m
  • Aeroporto Afonso Pena – São José dos Pinhais – Curitiba /PR (413,6 km)
    Pista 15/33 – 2.218 m x 45 m
  • Aeroporto de Congonhas – São Paulo/SP (536,6 km)
    Pista 17R/35L – 1.883 x 45 m

  • Aeroporto Viracopos – Campinas/SP (509,1 km)
    Pista 15/33 – 3.240 m x 45 m.

FOTO: Aeroporto de Londrina, cedida por piloto anônimo ao portal.

OUTRAS QUESTÕES

    A discussão quanto a construção das novas taxiways, se faz muito mais necessária nesse momento, pois a atual disposição das vias, texto já abordado nesse portal, está provocando alguns contratempos com o gerenciamento de tráfego aéreo, principalmente em horários de pico, sendo um problema que não possuíamos na antiga disposição de vias de taxiamento no aeroporto de Londrina. Obviamente, também temos ainda a discussão de prazos e se de fato teremos o ILS instalado no aeroporto no futuro de curto prazo, ou seja, ainda há muito o que ser discutido e ainda veremos mais manchetes na imprensa sobre o nosso querido Aeroporto Governador José Richa.

CONCLUSÃO

    Vimos através desse texto de opinião que não existe ‘excesso de zelo’ para a Agência Nacional de Aviação Civil, tampouco para os órgãos reguladores e comissões internacionais de aviação civil, comprimento de pista é sempre ‘bem-vindo’, pois dispõe às companhias aéreas uma margem maior de segurança, economia e possibilidades em operar aeronaves maiores e mais pesadas, limitadas a categoria 4C (quatro ‘C’) em que o aeroporto de Londrina está homologado na ANAC.

SOBRE O AUTOR DESTE TEXTO

Fábio Faria.
Mini currículo: Bacharel em Ciências Aeronáuticas pela UNOPAR (2014). Especialista em Gestão Aeroportuária e MBA em Linhas Aéreas, UNOPAR (2015/2017). Analista de Controle Técnico de Manutenção Aeronáutica (CTM) | Gestor de Segurança Operacional (GSO) | Professor Acadêmico no curso de Ciências Aeronáuticas em Londrina/PR. Administrador e editor de redes sociais portal "TMA Londrina" desde 2012.

FONTES DE CONSULTA

  • FOLHA DE LONDRINA. Ampliação da pista do Aeroporto é 'excesso de zelo', diz Ratinho. Londrina, 22 de janeiro de 2025. Disponível em: <https://www.folhadelondrina.com.br/politica/ampliacao-da-pista-do-aeroporto-e-excesso-de-zelo-diz-ratinho-3268799e.html?d=1>. Acesso em: 28/01/2025 08:00.
  • "Relativo a consulta do comprimento e larguras de pistas dos aeródromos". DEPARTAMENTO DE CONTROLE DO ESPAÇO AÉREO BRASILEIRO (DECEA). Brasília, 28 de janeiro de 2025. Disponível em <https://aisweb.decea.mil.br/>. Acesso em 28/01/2025 08:30.


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