sexta-feira, 30 de setembro de 2016

EAB 2016 - Operações Aéreas

A 19ª edição da EAB Air Show ocorreu entre os dias 21 a 25 de Outubro de 2016

NA T6 - PR-TIK e o PR-ATB ao fundo
     Ao me voluntariar para participar da equipe organizadora da EAB (Expo Aero Brasil) Air Show 2016, eu não tinha a mínima ideia da experiência e dos aprendizados que levaria para casa no final do evento. Tudo começou alguns meses antes do evento quando meu coordenador de pós-graduação estava recrutando alguns voluntários para participar da feira, vi ali a oportunidade de me motivar novamente na aviação, pois como todos sabem estamos passando por uma forte crise econômica que afeta diretamente o mercado da aviação provocando a estagnação de todos os novos e recém formados da área, seja em solo ou no ar, todos estão com muita dificuldade para entrar no mercado de trabalho.

Kodiak 100, PR-KDK, um dos astros da feira
     Eu já conhecia a Expo Aero, fui em alguns eventos e no último, em 2015, ao ver meus queridos amigos trabalhando como voluntários criei uma meta: “ano que vem vou me voluntariar”. Dito e feito, consegui entrar para o time! Estava muito feliz, finalmente eu faria algo proveitoso e, mesmo sendo um trabalho voluntário, receberia muito conhecimento e experiência em troca do meu suor e energia. 

     De início o pensamento estava focado na correria que seria para participar da feira, pois todos os dias teríamos que ir e voltar de Maringá para Londrina em um ônibus fretado pela UNOPAR. Acredite, isso foi a coisa mais irrelevante no final, pois com os dias trabalhados esse cansaço seria sobreposto pela satisfação em ser útil. 
   
     Éramos um grupo não muito grande de voluntários, alguns com muita experiência na área e outros com pouca ou quase nenhuma. Eu estava no meio termo, afinal 5 anos estudando aviação, muitos outros na simulação e o contato físico com as máquinas te ensina como tocar em uma aeronave sem danificá-la ou por outras pessoas em risco. 

Pilatus PC-12
     Desde o início o meu foco era atuar na área de Operações Aéreas para ter um contato a mais com as aeronaves e adquirir mais conhecimento prático ao lidar com máquinas caríssimas e perigosas. No primeiro dia eu já passei um susto, quase fiquei de fora da equipe de Operações Aéreas, se não fosse o meu pedido a querida “Chefa” para participar dessa equipe, já que todos os requisitos batiam comigo como ter força física, aguentar o sol, não ser “reclamão” e a capacidade de receber ordens sem titubear. 

Pátio da feira
     Dentro da equipe de Operações Aéreas eu estava muito feliz e continuei então com a meta de trabalhar todos os dias com um sorriso no rosto e dar o melhor de mim no que fosse preciso. Logo no primeiro e segundo dia a equipe recebeu instruções, treinamentos e começamos então a nos conhecer melhor, o que gerou elos mais fortes entre os membros, e passamos a viver o lema dos mosqueteiros “um por todos e todos por um”. 

     Fomos uma equipe bem versátil e unida, revezávamos e cada um fazia um pouco do trabalho do outro para todos terem a mesma oportunidade de aprender com tudo o que acontecia ao nosso redor. Foram dias maravilhosos, tínhamos os melhores “chefes” que poderíamos ter naquele momento, sempre motivados, precisos e amigos. Creio que, no geral, não os decepcionamos, fizemos nosso trabalho com sorriso no rosto, com braços prontos para puxar/empurrar aeronaves e manter seguro as instalações e a proximidade do público com as aeronaves em movimento. 

Efetuando mais um balizamento para ingresso na feira
     Uma das funções mais almejadas por mim dentro das Operações era o balizamento das aeronaves, receber uma aeronave acionada, instruir o comandante a parar no lugar certo para cortar os motores e seguirmos em escolta até o destino final da aeronave. Alguns dias se passaram até eu conseguir balizar uma aeronave, e, digamos “que Aeronave, hein?”, foi um King Air B200, uma das máquinas que mais admiro na aviação. 
   
     Na função de balizador eu não sabia qual seria o tipo de aeronave que iria balizar, somente tinha a escuta do Solo Maringá dando instruções para a aeronave e meus “chefes” ao lado confirmando a vinda da mesma e supervisionando o meu trabalho. Foi então que o “Kingão” surgiu na taxiway e meu coração disparou com o pensamento “Cara, vou balizar um B200”... Pode parecer bobo, mas estar frente aquela máquina com raquetes sinalizadoras é uma emoção e tanto. O ápice da emoção foi quando fiz sinal a ela reduzir e parar totalmente quando os motores Pratt & Whitney PT6 deram o último rugido para a parada total e assim que as hélices pararam de girar me senti realizado e orgulhoso de ter feito aquele pequeno serviço de maneira satisfatória. Porém, como não era tolerado qualquer distração, não foi possível  alguém registrar meu primeiro balizamento. 

Cessna C510 Mustang, "Quente" PR-HOT
     Durante todos os dias da feira até Sábado, enfrentamos temperatura alta e sol muito forte. Estávamos devidamente preparados para enfrentar esse clima, pois as instruções foram claras para nos cuidarmos. No Sábado passamos pela prova de fogo, uma movimentação altíssima de aeronaves chegando e saindo, não tínhamos descanso, não tínhamos tempo para ficar cansados, apenas fazíamos o trabalho com honra de estarmos ali. Como era esperado, além do grande fluxo de aeronaves estávamos lidando com um grande fluxo de pessoas chegando na feira.

     Já ia me esquecendo de narrar o primeiro contato com uma “peça de museu que voa” na qual tivemos o privilégio de cuidar e tocar. O grande NA T6 de Tike Bazaia, astro daqueles dias, todos queriam ver a grande aeronave treinadora que fez parte da história da aviação mundial e ainda nas cores originais da marinha americana. Além do lindo Extra 300 do filho de Tike, Beto Bazaia, o RV8 do CMTE Arnaldo Ferrari e o Extra 230 de Luiz Dell’Aglio, que marcaria nossas almas e corações para sempre. 

Meu último registro fotográfico do PT-ZUN de Luiz Dell'Aglio
     No início da tarde de Sábado recebemos ordens para trazer as aeronaves acrobatas para perto de nosso “Q.G” (Quartel General), onde ficávamos para anteder as aeronaves que chegavam ou partiam da feira. Fomos então mandados ao hangar onde estavam 3 aeronaves que se apresentariam durante a tarde. Foi lá que tive um dos últimos contatos com o Extra 230, PT-ZUN, me impressionava a leveza que aquela aeronave tinha ao tocar em sua asa e ver seu deslocamento apenas com um pouco do peso de minha mão. 

     Quando as aeronaves já estavam posicionadas no quadrante próximo ao nosso “Q.G” eu registrei a última foto do PT-ZUN que logo sairia para apresentar seu show aéreo. Todos estavam felizes, todos animados, tudo estava completamente normal, todos conversando, rindo e ansiosos para as apresentações que estavam programadas. Fui transferido de função e tive que ajudar a ordenar o fluxo de carros na rodovia que da entrada para o aeroporto, feira ou retorno para a cidade de Maringá. 
          
Esquadrilha da Fumaça no pátio de Maringá
           Lembro-me da chegada tão acalorada da Esquadrilha da Fumaça e seus Super Tucanos A-29, eu estava bravo pela quantidade de mosquitos que me acharam um alvo fácil para se alimentarem e somente por algumas vezes eu olhava para o céu para ver as manobras de uma pequena aeronave. Não sabia que era o Extra 230 do Dell, parecia tudo normal e em uma última manobra não vi mais a aeronave. Como estávamos em um terreno mais baixo que o aeroporto, era de se esperar que aeronave teria se recuperado da manobra e efetuado um pouso. Não chegou a passar pela minha cabeça que aquele acontecido triste acabara de ocorrer na nossa frente. 

      Recebemos ordens de abandonar nossa função e retornar para a feira, ao voltar, percebi uma pequena correria dos membros organizadores e vi algumas pessoas chorando, apreensivas e com olhar vazio, alguma coisa aconteceu... 

      Fui informado então que uma aeronave acabara de se acidentar, a mesma estava se apresentando ao público e ao saber que era o Extra 230 do CMTE Dell’Aglio rapidamente a emoção veio em cheio transbordando pelos olhos, somando a energia tensa que acabara dominando o local, porém não poderia desanimar em um momento tão crucial, continuei meu trabalho de cabeça erguida, embora abalado e em um estado de choque pelo ocorrido, estava disposto a garantir a segurança da feira e dar forças a quem precisasse naquele momento. 

     Tudo foi passando como um filme na cabeça, a imagem do Dell feliz com os outros comandantes não saia da cabeça e toda hora reflexões vinham em mente sobre a fragilidade da vida, era algo impossível de não pensar naquele momento. Foi impossível não ficar abalado naquela situação, dávamos forças uns aos outros, aguentamos firmes e garantimos a segurança do evento em pleno código vermelho. 

     O momento mais triste daquela fatídica tarde foi, devido a rapidez das informações, ter recebidos fotos do local da queda e dos destroços. Vimos naquelas imagens o pior, a perda de alguém que por amor partiu para o plano superior fazendo o que mais gostava. A dor foi grande e atingiu em cheio nossos corações, pois espelhávamos o acontecido em nós mesmos e em nossos familiares que sempre se preocuparam no perigo das atividades aéreas nos alertando sobre a fragilidade da vida. Em um momento estamos bem, felizes, fazendo o que mais gostamos e em outro deixamos essa vida para os braços de Deus. O melhor que podíamos fazer naquele momento era orar pelo Dell e garantir a segurança das Operações, foi o que fizemos. 

     No Domingo, último dia de Operações, abaixamos as bandeiras a meio mastro e seguimos para nossas funções como mais um dia normal, ou pelo menos próximo disso, fizemos o máximo possível para que continuássemos atuando apesar do luto que estávamos sentindo. Olhei para o céu e vi a beleza que fazia, um sol tímido entre nuvens que mais cedo provocaram um leve e passageiro chuvisco, foi nesse momento que fiz mais uma prece a Ele por estar ali com saúde e disposição para mais um dia de trabalho. 

     Recebemos o filho do Dell, prestamos homenagens a família e  transmitimos forças devido à perda de um pai querido como era por todos. 

     Acho que não conseguiríamos ter forças se não fosse o nosso querido locutor Vadico que mesmo sentindo a perda de um grande amigo colocou ótimas músicas que ao longo daquele domingo foi nos motivando a continuar nosso trabalho de cabeça erguida e novamente com disposição. Afinal, era o nosso último dia, não sabemos se ano que vem nos reencontraremos e assim fizemos nosso trabalho até a finalização com uma linda homenagem da Esquadrilha da Fumaça ao amigo Dell.

Super Tucano A-29 nº 6 da Esquadrilha da Fumaça
     O movimento então foi se dispersando até concluirmos a nossa participação na feira, claro, tiramos muitas fotos, muitas recordações boas ficaram gravadas em nossa mente. Sinto ao escrever isso uma enorme saudade de todos os dias que trabalhei nas Operações Aéreas da EAB 2016, com um misto de satisfação e honra por ter vestido aquela camiseta vermelha. 

     Agradeço imensamente a todos que passaram pelo meu caminho naqueles dias de feira, todas as novas amizades e os novos ensinamentos. Vivemos dias extremos de alegria e tristeza, derramamos nosso suor em troca de toda experiência e aprendizado único que poucas pessoas tem o privilégio de ter. O que fica aqui no peito é a saudade dos amigos, do trabalho e também a certeza que nos próximos anos, se Ele permitir, estarei novamente na equipe com um grande sorriso no rosto para ajudar no que for possível. 

Vídeo Bônus: EAB 2016 - Operações Aéreas


OPERAÇÕES AÉREAS EAB 2016!!!
Por Fábio Faria, o "Miudinho".

4 comentários:

  1. Fábio ficou feliz em ler o que escreveu. Os Vermelhinhos são uma equipe..Trabalhar em equipe é saber ser parte de um todo. É como ser uma parte fundamental de um corpo, mas sabendo que sem corpo essa parte de nada serve. Ter a capacidade de trabalhar bem em equipe mostra humildade, tolerância, inteligência emocional e companheirismo.

    Ninguém é nada sozinho. E se queremos fazer algo grande, importante e que nos traga orgulho, precisamos fazer em equipe. Alcançar o sucesso com um esforço coletivo é muito mais prazeroso.

    Trabalhando em equipe ficamos mais motivados e comprometidos, afinal uns dependem dos outros, e todos são responsáveis pelas falhas e pelo sucesso. Por isso, o trabalho em equipe deixa todos mais fortes.

    O trabalho em equipe é união e amizade em prol de um bem e de um objetivo comum, por isso é muito mais nobre do que uma batalha individual.

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    1. Grande, Plange.
      Quando resolvi narrar a minha experiência na EAB eu realmente fiquei pensando em como descrever toda a emoção, toda aquela experiência recebida em um texto simples e objetivo. Realmente vivemos intensamente aqueles dias de feira e aprendemos na prática o verdadeiro significado de trabalho em equipe, como você mesmo disse, "ninguém é nada sozinho", nos fortalecemos e o trabalho deixou de ser de fato apenas um "trabalho" e sim satisfação em cumprir o nosso dever com sucesso.

      Sem dúvidas esses ensinamentos ficarão gravados em nós e irá nos auxiliará em nossa vida profissional, pois mais uma vez ratifico o seu dizer, porém adaptando-o, na aviação não somos nada sozinhos e nada podemos fazer sozinhos. É um ambiente que dependemos um do outro, pilotos, controladores, operadores, comissários, agentes, auxiliares, fiscais, despachantes, entre vários outros cargos envolvidos para que a atividade aérea seja praticada de modo seguro e eficaz. Esse foi o ensinamento mais precioso de todos, trabalho em equipe.

      Muito obrigado pelo feedback, fico muito feliz que meu texto chegou tão longe e espero reencontrar todos novamente nas próximas edições da EAB.

      Um abraço!

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  2. Ricardo Hussne Danieli1 de outubro de 2016 às 18:26

    Maravilhosa narrativa e vídeo sensacional! Parabéns à toda equipe da EAB!

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